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DATA DA PUBLICAÇÃO 13/02/2017 | Educação
Sem investimento, reforma do ensino médio pode piorar desigualdade, dizem especialistas
Texto final da medida provisória foi aprovado nesta quarta (8) no Senado; entre as preocupações de especialistas em educação está a abertura de precedentes para a privatização.

A reforma do ensino médio aprovada no Senado Federal na noite desta quarta-feira (8) não terá os efeitos desejados caso não haja investimento na área, segundo afirmaram ao G1 especialistas em educação. Os senadores aprovaram o texto sem modificações por 43 votos a 13. Por se tratar de uma medida provisória, o texto tem força de lei desde a publicação no "Diário Oficial", em setembro.

Entre as preocupações levantadas pelos especialistas estão o risco de que o novo texto abra um precedente para a privatização de parte das atividades pedagógicas, e que, caso não haja um trabalho de formação específico no ensino fundamental 2, os estudantes podem sair prejudicados caso não estejam preparados para definir um "itinerário formativo" no início do ensino médio, quando eles têm, em geral, 15 anos, e podem não estar preparados para tomar essa decisão.

Para o conselheiro nacional da Educação Cesar Callegari, a reforma tem, ao mesmo tempo, partes positivas e problemas graves. Callegari diz que a proposta da flexibilização é boa, porém, há cinco anos, o governo criou o programa Ensino Médio Inovador com objetivo parecido e ele “empacou” por falta de recursos. Por isso, para a reforma sair do papel, é necessário investimento.

Outra crítica do conselheiro é que a reforma não toca em dois pontos cruciais para garantir a qualidade da educação no ensino médio: a formação de professores e a infraestrutura das escolas. “Haverá dinheiro para as inovações? A falta de recursos é a o nó dessa nova proposta. Também não se toca na questão do problema da falta de professores qualificados, da superlotação das salas de aulas. As questões estruturais permanecem aí agravadas pela PEC da limitação de gastos”, afirma.

Para Callegari, o texto [parágrafo 11 do artigo 4] da reforma também abre brecha para o ensino a distância no ensino médio, o que, segundo ele, ameaça o convívio e formação social do adolescente. "O convívio é fundamental para o jovem aprender o poder, aprender a lutar, a namorar... isso é coisa que se faz na escola, não pelo teclado. Ensino a distância vai levar ao barateamento da oferta de ensino."

"A falta de recursos é a o nó dessa nova proposta. Também não se toca na questão do problema da falta de professores qualificados, da superlotação das salas de aulas. As questões estruturais permanecem aí agravadas pela PEC da limitação de gastos."
(Cesar Callegari, conselheiro nacional de Educação)

Falta diretrizes para implementação

Priscila Cruz, presidente do movimento Todos Pela Educação, afirma que, desde setembro, quando a medida provisória foi anunciada pelo governo federal, entidades da área pressionam o Ministério da Educação para que o Conselho Nacional de Educação (CNE) produza diretrizes que guiem a implementação da reforma nas diferentes redes. O objetivo, com isso, é evitar que a implementação acontece de forma desigual. "As escolas já poderiam ofertar um itinerário formativo com ênfase mesmo sem essa medida provisória", lembra ela. "O que vai acontecer é o seguinte: agora tem uma indução mais forte nesse sentido, e o que vai fazer a diferença é a implementação disso, o que os estados vão fazer na prática. Foi tudo muito rápido e não teve o debate necessário. Já que o governo optou por fazer a MP, que a gente aprofunde o debate em um fórum técnico, que é o Conselho Nacional de Educação."

Priscila também alerta que o texto final representa uma "legislação básica" que, sozinha, não vai ser capaz de resolver os principais problemas estruturais da educação brasileira. "Essa medida é bem limitada, a gente não vai promover grandes revoluções no ensino médio por essa medida", diz ela, que lembra que grande parte do conteúdo da MP depende diretamente da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que ainda não está pronta. "A reforma do ensino médio gera tantas dúvidas e tantas apreensões porque é absolutamente dependente de um texto que ainda nem foi produzido."

Além disso, a presidente do Todos pela Educação ressaltou que algumas medidas introduzidas pela MP, e que acabaram referendadas no Congresso, acabam servindo como mais um "remendo" do que como uma solução. É o caso da possibilidade de contratação de professores sem diploma de licenciatura na área, medida que foi defendida pelo ministro da Educação, Mendonça Filho, como proposta para suprir a falta de professores nas escolas. "A solução é pagar melhor o professor, para que mais alunos de ensino médio queiram ir para a carreira docente. Ponto. Acabou. É que a gente fica querendo remendar, aqui ou ali. Vamos aprender com os países que têm qualidade na educação em escala. O principal é a valorização profissional, é pagar melhor, atrair o aluno do ensino médio para a carreira docente, e radicalmente melhorar a formação inicial e continuada. É isso. Não tem como ter atalho. A gente já tem o diagnóstico, já sabe o que tem impacto na educação. É o professor, não tem como escapar disso."

"A solução é pagar melhor o professor, para que mais alunos de ensino médio queiram ir para a carreira docente. Ponto. Acabou."
(Priscila Cruz, presidente do movimento Todos Pela Educação)

Precedente para a privatização

Apesar de reconhecer avanços no texto aprovado no Senado, Antônio Augusto Gomes Batista, coordenador de desenvolvimento de pesquisas do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), afirma que as mudanças não deveriam ter sido feitas por meio de medida provisória. "A proposta altera significativamente a legislação vigente. Alteração de tal expressão exigiria um amplo debate entre os diferentes setores da sociedade e não uma discussão restrita e apressada, que pode resultar na ampliação das desigualdades educacionais", afirmou ele, em nota. Um dos riscos, segundo ele, é o fato de que municípios e estados mais pobres não poderão oferecer aos estudantes mais do que uma opção de "itinerário formativo".

De acordo com Batista, a principal preocupação é o fato de que o "texto abre um precedente para que ocorra a privatização de algumas atividades no ensino médio", porque "componentes que não têm caráter obrigatório poderão ser oferecidos na modalidade a distância ou por meio de parcerias com instituições privadas".

"As desiguais chances que estados e municípios terão para fazer essas parcerias não foram discutidas. Nem as desiguais oportunidades que os 'parceiros' presentes em cada estado e município oferecerão aos estudantes para seu desenvolvimento e aprendizado. Tampouco se discutiu se queremos uma escola público-privada. Queremos?"

"O texto abre um precedente para que ocorra a privatização de algumas atividades no ensino médio. Isto porque componentes que não têm caráter obrigatório poderão ser oferecidos na modalidade a distância ou por meio de parcerias com instituições privadas."
(Antônio Augusto Gomes Batista, coordenador de desenvolvimento de pesquisas do Cenpec)

Maturidade

Mozart Neves, diretor de articulação e inovação do Instituto Ayrton Senna, acha que a reforma é necessária, pois o modelo anterior estava no “fundo do poço” e cada vez mais distante da realidade do adolescente brasileiro. No entanto, ele também aponta a necessidade de investir na formação dos professores e infraestrutura das escolas.

“Terá de haver um investimento do governo em relação à estrutura da escola e formação do professor. Isso terá de ser feito, caso contrário vamos correr o risco de ter uma lei que não atende as exigências e perspectivas dos jovens”, afirma.

Neves reforça que as escolas terão de “desenvolver projetos de vida” para os alunos do último ano do ensino fundamental 2 tenham autoconhecimento e maturidade e escolham os itinerários de formação no ensino médio de forma mais consciente.

"Terá de haver um investimento do governo em relação à estrutura da escola e formação do professor. Isso terá de ser feito, caso contrário vamos correr o risco de ter uma lei que não atende as exigências e perspectivas dos jovens"
(Mozart Neves, diretor de articulação e inovação do Instituto Ayrton Senna)

Artes, educação física, sociologia e filosofia

O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) criticou o texto aprovado no Senado, classificado como um "duro golpe" na educação. Em nota assinada pela presidente Maria Izabel Azevedo Noronha e divulgada nesta quinta-feira, a entidade afirmou que o "status" de disciplina obrigatória de artes, educação física, sociologia e filosofia foi alterado no que chamou de "jogo de palavras" no texto final.

"Se é verdade que artes, educação física, sociologia e filosofia são agora consideradas 'obrigatórias' na educação básica, é preciso atentar para o fato de que constam no projeto aprovado como 'estudos e práticas' a serem definidas na Base Nacional Curricular Comum (BNCC) e não como disciplinas, como atualmente consta na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Na realidade, portanto, o atual governo apagou a conquista dos educadores que haviam conseguido inserir na LDB sociologia e filosofia como disciplinas obrigatórias. Não necessariamente serão asseguradas como disciplinas na BNCC, com seus estatutos próprios."

A Apeoesp também disse que a permissão de contratação de professores com base em seu "notório saber", e não no diploma representa "a desregulamentação" da profissão docente, "institucionalizando o 'bico' de profissionais de outras áreas na educação básica com base em avaliações subjetivas dos sistemas de ensino".

"O atual governo apagou a conquista dos educadores que haviam conseguido inserir na LDB sociologia e filosofia como disciplinas obrigatórias. Não necessariamente serão asseguradas como disciplinas na BNCC, com seus estatutos próprios."
(Maria Izabel Azevedo Noronha, presidente da Apeoesp)

Por Vanessa Fajardo e Ana Carolina Moreno, G1
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